Os projetores de transparências ou slides são dispositivos analógicos ótico-mecânicos desenhados para projetar filmes positivos em grandes dimensões. Durante a década de 1950, no boom de eletrodomésticos dos EUA, desenvolveu-se o primeiro aparelho de uso caseiro para a projeção de imagens estáticas, com inspiração na lanterna mágica, inventada no século XVII. A indústria fotográfica amadora à cores já estava bem estabelecida na classe média pela Kodak (nos EUA), Agfa (na Europa) e Fuji (no Japão).O filme positivo colorido tinha uma vantagem sobre a fotografia, que era requerer somente um estágio no processo de revelação. Além disso, o rolo sendo enviado ao laboratório, o que retornava era apenas uma caixa de fotogramas, montados em molduras plásticas compactas, e não envelopes com papel fotográfico pesado. As projeções tornaram-se um evento social onde se emulava a projeção de um filme estrelado pela própria família, precedendo o cinema amador de 16 e 8 mm.

Os retroprojetores foram, por muitos anos, o equipamento básico para projeção de imagens em sala de aula.
Os projetores de slides tiveram seu pico de popularidade entre os anos 1960 e 70, quando multiplicaram-se em modelos compactos, simples e relativamente baratos. Os fabricantes japoneses buscavam reduzir o tamanho dos aparelhos e os americanos, a automatização.
Os projetores tiveram um grande uso na educação e em apresentações, e podiam ser encontrados em diferentes modelos: automático, manual ou semiautomático, de carretel linear ou circular. Também foram fabricadas variantes, como o retroprojetor. Até o final dos anos 1970, era comum ver esses equipamentos em reuniões familiares, aulas em grupo, conferências e exposições. Estes aparelhos formaram também parte da experimentação audiovisual de artistas e realizadores nas psicodelia lumínica que acompanhou o rock nos anos 1960 e 70.
Com o avanço da tecnologia digital, o mercado analógico começou a retrair-se. Os componentes e peças de reposição deixaram de ser fabricados, saindo da cadeia de produção industrial. Lentamente, estes dispositivos foram entrando no gabinete dos aparatos sem serventia.
O precário requer manutenção, atenção personalizada e soluções precisas para cada modelo.
Com o TAPP (Taller de Proyectores Precarios ou “Oficina de projetores precários”, em Português) nos propusemos a lançar um espaço de pesquisa, desenvolvimento e construção de projetores analógicos, utilizando recursos e materiais disponíveis atualmente. Nossos projetores são protótipos de código aberto, que podem ser transformados conforme a necessidade. Pensamos estes dispositivos como “próteses”, extensões do corpo do performer. A ilusão de movimento é executada pelo projecionista, seja movendo o modulador em um dos eixos ou vedando a luz com a palma da mão. Por esta razão, é uma ferramenta ideal para a montagem de um cinema sem película, permitindo também o uso de objetos, texturas, tintas, óleos, etc.

Colaboração entre Pablo Light Show & San Fransisco Light Works “The Last of the Best”. Foto: Jay Moss.
Para a construção dos diferentes protótipos, utilizamos papelão coletado nas ruas ou MDF. Estes materiais permitem ser modificados manualmente ou utilizando-se ferramentas simples. Deste modo, o foco de nosso trabalho vai além da construção de um dispositivo de projeção, concentrando-se em explorar suas possibilidades visuais e performáticas.
Algo instável, que perde seu equilíbrio, pode ser também a possibilidade de uma mudança de estado.
Os projetores que construímos são “precários”, o que pode significar várias coisas: em primeiro lugar, pode-se construir um projetor muito rapidamente – algumas horas de trabalho são o suficiente para vê-lo funcionando. Eles são também estruturas instáveis, suas peças podem soltar ou cair: o precário requer manutenção, atenção personalizada e soluções precisas para cada modelo. Soluções que, às vezes, não serão repetidas. Soluções sob medida para cada projetor, únicas.

Frank Zappa and the Mothers of Invention com projeções analógicas do Joshua Light Show, nos anos 1960.
Entendemos estes aspectos do “precário” que se manifestam em nossos projetores como um potencial de transformação. Algo instável, que perde seu equilíbrio, pode ser também a possibilidade de uma mudança de estado. Nos obriga a manter os sentidos em alerta, encontrar soluções, resolver problemas.
Um dos modelos mais desenvolvidos no TAPP, batizado de “Franky”, é um projetor de transparências feito de madeira MDF, lâmpada dicróica e lentes chinesas. O resultado é o esqueleto de um sistema de projeção ao qual se pode adaptar diferentes fontes de luz, aparatos óticos e elementos de modulação.
Trabalhando com esses Frankys, aprendemos a possibilidade de intercambiar três elementos principais: a fonte de luz, a parte ótica e os moduladores. Entendemos que, manejando estas variáveis, podemos construir inúmeros protótipos para projeção de transparências ou objetos opacos. No entanto, o que nunca conseguimos garantir é que dois projetores serão iguais. Mesmo que utilizemos as mesmas lentes, saídas do mesmo container procedente da China, o resultado é sempre diferente em distância focal ou luminosidade. Em outras palavras, ao contrário da produção industrial, que busca modelos em série, na construção precária nós sempre temos diferenças, modelos únicos e nenhuma padronização é possível.
Os moduladores são elementos que se interpõem na trajetória da luz a ser projetada através do sistema ótico. Em um projetor, a parte ótica funciona como um microscópio, que amplia o que, a olho nu, quase não percebemos. Uma característica dos nossos projetores é que podemos converter quase qualquer coisa
em um modulador de luz. Tudo que seja transparente, translúcido ou permita a passagem de luz sob a forma de contraste pode ser material projetável.

Galeria de projetores precários desenvolvidos pela TAPP em workshops.
Assim, encorajamos os participantes do TAPP a ligarem suas antenas e colocarem seu radar em “modo desfazer” ao andarem na rua, para olharem com novos olhos, por exemplo, utensílios de cozinha ou investigarem elementos orgânicos como plantas ou insetos. Grandes tesouros estão escondidos a nosso redor, mesmo no lixo. Claro que podemos também encontrar filmes de slides escondidos em armários ou brechós, ou mesmo produzi-los com pigmentos, tintas, gel ou óleo.
Um modelo que desenvolvemos em oficinas curtas ou viagens é o “ZAPATAPP”. Consideramo-lo o modelo mais sintético e simples, algo como a expressão mínima de um projetor: uma caixa de sapatos ou de papelão, duas lentes e uma fonte de luz. Se uma lanterna de LED é usada como fonte de luz, obtemos ainda um projetor sem fio, ideal para uso externo.
Outro aspecto desenvolvido no TAPP é a experimentação de trabalho coletivo. Nossa dinâmica de trabalho é de oficinas em grupo, onde o conhecimento e as experiências são compartilhadas de modo horizontal. Cada edição do TAPP culmina na formação de uma Orquestra Audiovisual Improvisada, em que os participantes criam coletivamente uma partitura que é executada ao final da oficina. Com a Orquestra, nos interessa explorar as possibilidades de projeção múltipla, as relações sinestésicas entre luz e som e, acima de tudo, a possibilidade de criação coletiva em tempo real.